BC acompanha tarifaço e vê juro alto por tempo “bastante prolongado”
Incertezas provocadas pelo tarifaço dos Estados Unidos e as expectativas de inflação não caminhando para a meta são elementos que fizeram com que o Banco Central (BC) veja a taxa básica de juros em patamar alto por “período prolongado de tempo”.
A explicação está na ata da última reunião do Comitê de Política Monetária (Copom) do BC, divulgada nesta terça-feira (5). O colegiado decidiu, na quarta-feira (30), manter a taxa básica da economia, a Selic, em 15% ao ano, nível mais alto desde julho de 2006 (15,25%).
A meta de inflação que deve ser perseguida pelo BC é de 3%, com intervalo de tolerância de 1,5 ponto percentual para cima ou para baixo. Ou seja, o limite inferior é 1,5% e o superior é 4,5%.
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Atualmente, a inflação oficial, medida pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), está em 5,35% em 12 meses.
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No documento que fundamenta a decisão do Copom, o colegiado afirma que o cenário de inflação segue desafiador em diversas dimensões e cita o ambiente externo, “mais adverso e incerto”.
“A elevação por parte dos Estados Unidos das tarifas comerciais para o Brasil tem impactos setoriais relevantes e impactos agregados ainda incertos a depender de como se encaminharão os próximos passos da negociação e a percepção de risco inerente ao processo”, registra a ata.
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A reunião da quarta-feira passada terminou horas depois de o governo americano impor tarifa de 50% a grande parte dos itens que o Brasil vende para os americanos.
Para o Copom, essa incerteza faz o colegiado “preservar uma postura de cautela”.
Somadas à incerteza internacional, o Copom enfatiza que as expectativas de inflação no Brasil estão desancoradas, isto é, não caminhando para o centro da meta do governo.
A ata lembra que a alta no preço dos alimentos perde ritmo, mas aponta que, no primeiro trimestre de 2027, o IPCA de 12 meses projetado é de 3,4%, ainda acima do centro da meta.
“Os núcleos de inflação têm se mantido acima do valor compatível com o atingimento da meta há meses, corroborando a interpretação de uma inflação pressionada pela demanda e que requer uma política monetária contracionista por um período bastante prolongado”, afirma o colegiado.
Fatores internos
Ao descrever o cenário interno, os diretores do Banco Central reconhecem que a escalada dos juros, iniciada em setembro de 2024, já produz efeitos de esfriamento na economia.
“O mercado de crédito, mais sensível às condições financeiras, tem apresentado uma moderação mais nítida”, diz a ata, acrescentando que o consignado privado “têm tido menor impacto do que era esperado por muitos participantes do mercado”.
Consignado privado é o chamado Crédito do Trabalhador, sancionado no fim de julho, que visa baratear o crédito para empregados da iniciativa privada com carteira assinada (CLT) e motoristas e entregadores de aplicativo.
O Copom reconhece, no entanto, que o mercado de trabalho segue aquecido, com recorde de taxa mínima de ocupação e de renda dos trabalhadores, o que alimenta a inflação.
“O mercado de trabalho segue dinâmico. Tanto do ponto de vista de renda, com ganhos reais consistentemente acima da produtividade, como do emprego, com redução expressiva da taxa de desemprego para níveis historicamente baixos, o mercado de trabalho tem dado bastante suporte ao consumo e à renda”, frisa o BC.
Os diretores apontaram também desafios provocados pela política fiscal do governo (gastos públicos).
“O Comitê reforçou a visão de que o esmorecimento no esforço de reformas estruturais e disciplina fiscal, o aumento de crédito direcionado e as incertezas sobre a estabilização da dívida pública têm o potencial de elevar a taxa de juros neutra da economia, com impactos deletérios sobre a potência da política monetária e, consequentemente, sobre o custo de desinflação em termos de atividade”.
Os diretores do BC ressaltam que o momento atual é de “interrupção no ciclo de alta de juros para examinar os impactos acumulados do ajuste já realizado, ainda por serem observados, e então avaliar se o nível corrente da taxa de juros, considerando a sua manutenção por período bastante prolongado, é suficiente para assegurar a convergência da inflação à meta”.
Política monetária
A taxa Selic é decidida a cada 45 dias pelo Copom e consiste na principal forma de a instituição fazer a inflação convergir para a meta. Desde setembro de 2024, o IPCA está acima do teto da meta (4,5%).
A trajetória ascendente dos juros começou em setembro do ano passado, a Selic saiu de 10,5% e, gradativamente, chegou aos atuais 15%.
Uma face do juro alto é o efeito contracionista, que combate a inflação. A elevação da taxa faz com que empréstimos fiquem mais caros – seja para pessoa física ou empresas ─ e desestimula investimentos, uma vez que pode valer mais a pena manter o dinheiro investido, rendendo juro alto, do que arriscar em atividades produtivas.
Esse conjunto de efeitos freia a economia. Daí vem o reflexo negativo: menos atividade tende a ser sinônimo de menos emprego e renda. De acordo com o BC, o efeito da Selic na inflação leva de seis a nove meses para se tornar significativo.