No Dia do Orgulho Lésbico, ativistas reforçam poder da luta coletiva
No dia 19 de agosto, é celebrado o Dia do Orgulho Lésbico. Além de ser um dia para reafirmar quem se é, a data marca também a luta por direitos e para o fim de qualquer preconceito e ódio contra mulheres lésbicas. Ativistas ouvidas pela Agência Brasil exaltam aquelas que vieram antes e destacam que a data é momento de reafirmar a importância de se organizar coletivamente.
“Se o caminho está um pouquinho mais pavimentado é porque teve muita gente antes. E a gente continua fazendo esse caminho”, diz a idealizadora da livraria Pulsa, a primeira livraria dedicada exclusivamente à temática e a autorias LGBTQIAPN+, Caroline Fernandes.
O Dia do Orgulho Lésbico relembra o Levante do Ferro’s Bar, em 19 de agosto de 1983, conhecido como o “Stonewall brasileiro”, em referência à Revolta de Stonewall. Em 28 de junho de 1969, LGBTQIA+ de Nova York que frequentavam o bar Stonewall Inn iniciaram uma série de protestos para denunciar a perseguição policial.
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No levante em São Paulo, as lésbicas organizadas no Grupo de Ação Lésbica Feminista distribuíam o jornal Chanacomchana no bar, até que foram impedidas de entregarem a publicação. Lideradas por Rosely Roth, as lésbicas, com o apoio de organizações de direitos humanos e do movimento negro e feminista, invadiram o Ferro’s Bar para denunciar a censura, a perseguição e a violência policial contra lésbicas.
Segundo Fernandes, o levante, que foi uma ação coletiva, mostra a força da atuação conjunta. “Todas essas datas importantes do movimento lésbico estão muito ligadas à rede. A essas mulheres estarem em comunidade. Acho que isso é importante ainda hoje também para direcionar a gente para esse lugar da rede, do estar juntas, para fazer uma revolução, desde a menor que seja até algo tão grande quanto foi a revolta do Ferro’s Bar”, diz.
Caminhada do Orgulho
No Rio de Janeiro, a data é marcada pela quinta Caminhada do Orgulho Lésbico, que ocorreu nesta terça, no centro da cidade. “A caminhada lésbica é um importante momento de reivindicação e luta pelos direitos das lésbicas”, diz a jornalista Camila Marins, que é editora da Revista Brejeiras, publicação feita por e para lésbicas.
Marins é também a idealizadora do Projeto de Lei Luana Barbosa, que busca promover campanhas, atividades e ações públicas de enfrentamento e erradicação do lesbocídio [assassinato de mulheres lésbicas por ódio e preconceito], bem como de construção de uma cultura de não violência contra as mulheres lésbicas. O texto, que estabelece 13 de abril como Dia Municipal de Enfrentamento ao Lesbocídio, virou lei em municípios como Niterói e tramita na Câmara dos Deputados.
A lei traz o nome de Luana Barbosa, mulher negra, lésbica e periférica que foi brutalmente espancada e morta, vítima da violência policial. O crime ocorreu em 2016, em Ribeirão Preto, no interior do estado de São Paulo.
Para Marins a luta pelos direitos das mulheres lésbicas, avançou, apensar de ainda enfrentar muitos desafios. “Ouso dizer que avançamos em apresentar e aprovar essa legislação em diversos municípios e estados do Brasil. Mas ainda temos muito a avançar. Além da aprovação de projetos de lei, precisamos do comprometimento político do Executivo em aportar orçamento público para a execução das políticas públicas específicas para lésbicas”, diz Marins.
Visibilidade e luta por direitos
Agosto, como um todo, é considerado o mês o da Mês da Visibilidade Lésbica. Além do Dia do Orgulho, o dia 29 de agosto é o dia da Visibilidade Lésbica, data em que ocorreu, em 1996, o primeiro Seminário Nacional de Lésbicas (Senale), no Rio de Janeiro.
No Rio, entre os dias 19 e 29, o projeto 10 Dias de Ação Sapatão, da vereadora Monica Benicio (Psol), promove uma série de atividades. Entre elas, a Câmara Municipal do Rio de Janeiro entrega a medalha Chiquinha Gonzaga ─ a mais alta condecoração concedida pela Câmara ─ a três mulheres lésbicas: a cantora e compositora, Cátia de França, e o casal Nicinha (in memoriam) e Jurema, que ficaram conhecidas na série da Netflix Meu amor: Seis histórias de amor verdadeiro. Nicinha faleceu no ano passado, após um casamento de 40 anos com Jurema.
“Celebrar o orgulho lésbico é lembrar que mulheres lésbicas construíram e fazem parte desse país e da história dessa sociedade que constantemente apaga mulheres que amam outras mulheres. O orgulho é uma ferramenta política de afirmação”, diz Benicio, que é viúva da vereadora Marielle Franco, assassinada em 2018.
No dia 29 de agosto, também será a nona edição do Ocupa Sapatão, intervenção política, artística e cultural feita por e para mulheres lésbicas. “Este ano, o Ocupa será em homenagem à Marielle e tenho certeza que será muito emocionante”, diz Benicio.
Discriminação
De acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), pelo menos 0,9% das mulheres brasileiras declara-se lésbica e 0,8% bissexual. O IBGE reconhece que o percentual pode estar subestimado, principalmente porque o estigma e o preconceito por parte da sociedade podem fazer com que as pessoas não se sintam seguras em declarar a própria orientação sexual a um instituto de pesquisa.
Entre 2021 e 2022, a Associação Lésbica Feminista de Brasília ─ Coturno de Vênus e a Liga Brasileira de Lésbicas (LBL) realizaram o Lesbocenso Nacional, para conhecer o perfil das mulheres lésbicas brasileiras. Os dados mostram que a maior parte dessas mulheres, 78,61%, sofreu lesbofobia, ou seja, discriminação por serem lésbicas.
De acordo com o Dossiê sobre Lesbocídio no Brasil, pelo menos 135 lésbicas foram mortas entre 1983 e 2013. Os registros são feitos pelo Grupo Gay da Bahia (GGB), organização não governamental voltada para a defesa dos direitos dos homossexuais no Brasil. O dossiê aponta que, desde que começaram a ser registrados, na década de 1980, os casos tiveram aumentos.
De 2016 a 2017, o número de casos registrados teve crescimento de 80%, saltando de 30 em 2016 para 54 em 2017. Em 2023, último ano com dados disponíveis, o GGB registrou nove mortes violentas de lésbicas.