Justiça condena ex-prefeita e ex-auxiliares por sobrepreço e remédios vencidos no Conde
Uma decisão da Justiça de Conde condenou, por improbidade administrativa, a ex-prefeita do município e ex-secretária de Educação do Estado, Márcia Lucena; a ex-secretária de Saúde do município, Renata Martins; e a ex-coordenadora de Farmácia, Cláudia Germana de Souza. Elas foram alvo de uma ação do Ministério Público que apontou prejuízos aos cofres públicos com compras feitas junto ao Lifesa.
O caso é um desdobramento da Operação Calvário, que na época encontrou mensagens do delator Daniel Gomes sinalizando para uma possível articulação com o objetivo de facilitar a contratação do Lifesa – Laboratório Industrial Farmacêutico do Estado da Paraíba – junto à prefeitura.
Na ação o MP também relata o acúmulo de medicamentos vencidos, que teriam sido adquiridos com sobrepreço e em quantias maiores do que a demanda da cidade. As compras foram feitas através de dispensa, o que teria beneficiado o laboratório.
Na ação o MP havia apontado a prática de enriquecimento ilícito por parte de Márcia Lucena, mas a tese foi rejeitada por falta de provas.
“Nos autos do processo, consta um trecho de gravação ambiental datada de 06/09/2016 (arquivo intitulado “Dra e pref Marcia Lucena”), na qual o interlocutor DANIEL GOMES DA SILVA menciona que “a gente vai te ajudar […] pra dar uma força de 100 mil reais” (ID 40753668 – Pág. 13), dirigindo-se à promovida. Todavia, não há qualquer comprovação adicional — como documentos, extratos bancários, registros contábeis ou outras formas de prova robusta — que atestem o efetivo recebimento do valor por parte da promovida”, considera a sentença.
No entanto, a decisão considera que ficou configurada a prática de improbidade e de prejuízo para o poder público de R$ 206 mil, com a escolha do Lifesa e por sobrepreço.
“No caso dos autos, restou comprovada a contratação direta da empresa LIFESA por inexigibilidade de licitação, sem demonstração de exclusividade ou justificativa técnica idônea, em afronta direta aos princípios da legalidade e da economicidade”, diz a sentença.
Medicamentos estocados e vencidos
Um outro ponto questionado na ação do MP diz respeito ao armazenamento de medicamentos com data de validade vencida. De acordo com o processo, em junho de 2020 foi constatado o acúmulo de 93.460 medicamentos vencidos em imóveis do município.
O prejuízo estimado é superior a R$ 206 mil, com base em uma análise feita pela CGU.
“Omissão não decorreu de negligência isolada, mas de uma atitude consciente e reiterada de desatender ao dever de gestão eficiente da coisa pública. Portanto, presentes os elementos objetivos (ocorrência de dano ao erário), subjetivos (dolo) e normativos (violação ao art. 10, X, da LIA), impõe-se o reconhecimento da prática do ato de improbidade administrativa pelas rés”, diz a sentença.
O que diz a sentença sobre as investigadas
Márcia Lucena
“Na qualidade de Prefeita do Município de Conde, autorizou e conduziu a contratação direta da empresa LIFESA mediante inexigibilidade de licitação irregular, resultando em sobrepreço e prejuízo ao erário de R$ 206.952,00. Além disso, omitiu-se na fiscalização da correta conservação dos medicamentos adquiridos, permitindo o vencimento e descarte de grande quantidade de insumos”.
Sanções:
i) Suspensão dos direitos políticos por 08 (oito) anos;
ii) Multa civil equivalente ao valor do dano, totalizando R$ 206.952,00;
iii) Proibição de contratar com o Poder Público ou receber benefícios fiscais/creditícios por 08 (oito) anos;
iv) Ressarcimento integral e solidário do dano ao erário, no valor de R$ 206.952,00.
Renata Martins
“Secretária de Saúde, foi responsável pela emissão do Ofício nº 369/2017-SMS/GS que deflagrou o processo irregular de inexigibilidade, além de assinar o contrato com a LIFESA e liberar pagamentos. Contribuiu ativamente para o direcionamento da contratação superfaturada e, como gestora da pasta, também se omitiu na adequada conservação dos medicamentos adquiridos”.
Sanções
i) Suspensão dos direitos políticos por 05 (cinco) anos;
ii) Multa civil correspondente a metade do valor do dano, totalizando R$ 103.476,00;
iii) Proibição de contratar com o Poder Público ou receber benefícios fiscais/creditícios por 05 (cinco) anos;
iv) Ressarcimento solidário do dano ao erário, em conjunto com Márcia Lucena.
Cláudia Germana de Souza
“Na função de coordenadora de farmácia, a partir de setembro de 2019, foi identificada como responsável pelo estoque de medicamentos vencidos e armazenados de forma irregular. Ainda que parte dos fármacos já estivesse comprometida antes de seu retorno, sua omissão em corrigir a irregularidade após reassumir a função demonstra dolo específico, embora em menor intensidade do que as demais rés”.
Sanções
i) Suspensão dos direitos políticos por 03 (três) anos;
ii) Multa civil correspondente a um quarto do valor do dano, totalizando R$ 51.738,00;
iii) Proibição de contratar com o Poder Público ou receber benefícios fiscais/creditícios por 03 (três) anos;
Outro lado
Da decisão cabe recurso. Durante o processo, as defesas alegaram ausência de dolo, dificuldades estruturais herdadas e o impacto da pandemia da COVID-19.
Os advogados também argumentaram que não houve recebimento de vantagem indevida e questionaram a legalidade do processo.
Ao Blog, a ex-prefeita Márcia Lucena disse que vai recorrer da decisão. Ela lembrou que ficou provado que não houve enriquecimento ilícito e que os seus advogados apresentaram, também, provas de que não houve sobrepreço.
“Há ainda uma questão do foro. Os advogados entendem que esse processo nem deveria ter sido julgado nessa Vara, por conta de decisões recentes do STF que modificaram essa questão do foro. Tudo isso colabora para que nós possamos recorrer”, avaliou.