Entenda por que a Justiça mandou soltar policiais militares suspeitos de chacina no Conde
A Justiça da Paraíba decidiu mandar soltar cinco policiais militares suspeitos de chacina no Conde, que terminou na morte de cinco jovens. Um sexto policial teve a prisão convertida em preventiva. A decisão foi assinada pela juíza Lessandra Nara Torres Silva, da Vara Única do Conde, nesta terça-feira (9).
O crime pelo qual os policiais militares respondem aconteceu no dia 15 de fevereiro deste ano, quando cinco jovens, com idades entre 17 e 26 anos, supostamente estavam se preparando para fazer um ataque no Conde, para vingar um feminicídio cometido horas antes. Cinco policiais suspeitos foram presos no dia 18 de agosto, sendo eles:
- Soldado Mikhaelson Shankley Ferreira Maciel
- Sargento Marcos Alberto de Sá Monteiro
- Sargento Wellyson Luiz de Paula
- Sargento Kobosque Imperiano Pontes
- Cabo Edvaldo Monteval Alves Marques
O Jornal da Paraíba explica o que a Justiça considerou para soltar os policiais militares, determinar que eles devem utilizar tornozeleira eletrônica e por que apenas um policial continua com mandado de prisão preventiva.
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Por que a Justiça decidiu soltar os policiais
Após a prisão dos militares, a Delegacia de Repressão ao Crime Organizado tentou localizar uma testemunha ocular mencionada em depoimento, mas não obteve sucesso. A Justiça também havia determinado a reconstituição do caso, mas os policiais investigados optaram por não participar, exercendo o direito ao silêncio.
O setor pericial concluiu que seria tecnicamente impossível realizar a reprodução simulada do crime sem a participação dos investigados. Com isso, os principais fundamentos da prisão temporária ficaram inviabilizados.
Na decisão, a juíza destacou que não é possível prolongar a prisão “na expectativa de localização de uma testemunha não identificada ou de diligências que foram expressamente recusadas pelos investigados, inviabilizando sua execução”.
A defesa dos policiais também pediu a revogação das prisões, argumentando que não havia mais finalidade na medida. O Ministério Público também reconheceu a perda de utilidade da prisão temporária e concordou com a substituição por medidas cautelares, além de defender a prisão preventiva do policial foragido.
Apesar da revogação, segundo a decisão, outras diligências continuam, como a análise de celulares e novos depoimentos de testemunhas que se sentiram encorajadas a falar durante a custódia. A Justiça considerou, no entanto, que esses elementos não justificariam a manutenção da prisão temporária.
As medidas cautelares contra os policiais
Apesar de conceder a liberação da prisão temporária, a Justiça determinou o cumprimento das seguintes medidas cautelares:
- Uso de tornozeleira eletrônica;
- Afastamento imediato do serviço operacional (policiamento ostensivo ou tático);
- Proibição de manter contato com familiares das vítimas, testemunhas e demais investigados;
- Proibição de frequentar localidades próximas às residências das vítimas e seus familiares, complementando a medida de monitoração eletrônica;
- Recolhimento domiciliar no período noturno, das 20h às 5h do dia seguinte, e nos dias de folga;
- Comparecimento mensal em juízo;
- Proibição de se ausentar da comarca de suas residências por mais de 10 dias sem autorização da justiça.
A Justiça determinou monitoração eletrônica dos policiais para acompanhar a localização dos investigados e restringiu o contato com testemunhas, familiares das vítimas e outros investigados para evitar intimidações. Também afastou os militares do serviço operacional, mantendo os suspeitos em funções administrativas, para impedir influência na investigação e preservar a imagem da corporação.
A situação do policial militar nos Estados Unidos
Um sexto policial, identificado como Tenente Álex William de Lira Oliveira, estava nos Estados Unidos durante a operação e segue foragido. Ao contrário dos outros cinco policiais que tiveram a prisão temporária convertida em medidas cautelares, a Justiça decidiu expedir um mandado de prisão preventiva contra ele.
Inicialmente, a defesa do suspeito justificou que ele estava em uma viagem de férias. Posteriormente, a defesa pediu a revogação da prisão alegando que a esposa do policial enfrentava uma gravidez de alto risco, o que teria impedido seu retorno ao Brasil. O advogado também argumentou que não houve intenção de fuga e que o policial se apresentaria à Justiça após o nascimento do filho.
A Justiça entendeu que o policial investigado fugiu do processo ao permanecer nos Estados Unidos mesmo após a decretação de sua prisão. Embora a defesa tenha apresentado laudos que comprovam a gravidez de alto risco, com recomendação médica contra viagens aéreas prolongadas, o fato de ambos terem viajado ao exterior foi considerado contraditório.
Assim, o Ministério Público pediu a conversão da prisão temporária em preventiva, para garantir a aplicação da lei penal, o que foi concedido pela Justiça.
Relembre a prisão dos policiais militares
O Ministério Público da Paraíba pediu a prisão temporária de seis policiais militares suspeitos do crime. A Justiça expediu os mandados no dia 12 de agosto, e cinco deles foram presos no dia 18, durante a Operação Arcus Pontis.
Na decisão, a Justiça apontou que há “fortes indícios de homicídio qualificado e fraude processual”, além de inconsistências entre os relatos dos policiais e os laudos periciais. Também foram considerados indícios de não preservação da cena do crime, risco de influência sobre testemunhas e a necessidade de perícias complementares.
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A operação reúne 72 agentes, do Ministério Público, Polícia Civil e Polícia Militar. Foram expedidos seis mandados de prisão temporária, mas um dos alvos está fora do país, em viagem. Também foram cumpridos seis mandados de busca e apreensão nas residências dos alvos.
Chacina no Conde: as investigações do crime
Segundo o pedido de prisão temporária, há indícios de homicídio baseados em depoimentos de testemunhas e laudos periciais. O documento aponta que, no momento do crime, os jovens não teriam oferecido qualquer possibilidade de reação.
As investigações aponta que os policiais teriam removido os corpos das vítimas do local do crime, todos com ferimentos letais na cabeça, e utilizado fuzis de alto poder de destruição.
Os veículos das vítimas também foram retirados da cena e levados para a Central de Polícia, em João Pessoa, antes que a Polícia Civil fosse acionada para realizar a perícia técnica. Durante a investigação, uma testemunha relatou que os policiais usavam máscaras e recolheram cápsulas no local do crime.
Outro depoimento registrou que um testemunha ocular, que ainda não foi identificada, descreveu que dois jovens estavam fora do carro com as mãos na cabeça, um dentro do veículo e dois no chão, enquanto policiais apoiavam os pés sobre seus pescoços.
Um laudo pericial apontou que os carros em que os jovens estavam foram atingidos por mais de 90 tiros: 74 em um veículo e 18 no outro, todos disparados de fora para dentro. A perícia ainda ressalta que, sem análise completa no local, não seria possível afirmar com certeza se houve disparos de dentro para fora dos veículos.
O que diz a defesa dos policiais militares e da corporação?
A defesa dos policiais, representada pelo advogado Luiz Eduardo, afirma que os policiais realizavam um “checkpoint” e reagiram a tiros disparados pelos ocupantes dos veículos. Os jovens feridos teriam sido levados a uma unidade hospitalar, onde acabaram morrendo.
O comandante-geral da Polícia Militar da Paraíba, coronel Sérgio Fonseca, afirmou acreditar na versão dos policiais, mas disse que, caso a investigação comprove outra versão, os envolvidos serão responsabilizados.